Xadrez por correspondência e ética
Grandes filósofos discutiram e
definiram os conceitos básicos das complexas leis éticas e morais nas relações
humanas. – Consultei alguns livros sobre este assunto tão amplo, cheio de
definições conforme a abordagem e aplicação. Encontrei uma vasta descrição
sobre este tema, moral e ética, tão em voga atualmente em nossa sociedade
brasileira, na Enciclopédia Mirador Internacional. Com base nesta consulta
podemos afirmar que o objetivo da ética é normativo, embora ela própria não o
seja, porque o comportamento humano se realiza sempre em referência a valores.
O mundo destes valores é o da cultura, para a conduta na sociedade, segundo os
valores desejáveis ou ideais dessa mesma sociedade. Também, podemos afirmar que
a ética está ligada aos princípios, e que as leis estão no campo da moral. Leis
estas que devem ser avaliadas a partir de seus pressupostos éticos. Então,
espera-se que os integrantes de um grupo, clube ou uma associação enxadrística
sigam os bons preceitos éticos esperados de cada participante.
Figura 1 – Pioneiro Benjamim
Franklin escreveu Morals of Chess,
publicada em 1779 (1).
Evolução do xadrez postal
Antes do evento da internet e do
surgimento do celular, precisamente na década setenta vivíamos momentos
aparentemente lento. Lembro-me da ida aos correios para postar uma carta
simples, ou um postal com uma paisagem de minha cidade. E no conteúdo da
mensagem escrita estava a anotação algébrica de um lance de xadrez. Os torneios
editados pelo Clube de Xadrez Epistolar Brasileiro (CXEB) tinham grupos de sete
jogadores e turnos com duração em torno de um ano e meio. Em cada turno
jogávamos seis partidas em paralelo, no qual dois jogadores, os dois primeiros,
eram classificados para a próxima categoria.
As cartas eram enviadas e
ficávamos na ansiedade aguardando a resposta. Naquela época, os correios eram
eficientes, para qualquer lugar do Brasil uma carta simples, em média, chegava
dentro quarenta e oito horas. Através das postagens algumas vezes eram feitos
amigos, porque além do registro do lance da vez. Seguia uma apresentação
resumida de sua pessoa e na resposta sempre aparecia uma pergunta, ou, uma
observação sobre a cidade, trabalho, família ou outra coisa. E assim começava
uma amizade em paralelo ao desenrolar do jogo, onde falar do confronto nem
pensar. – Era muito bom jogar por
correspondência.
Também, lembrei-me do meu primeiro
computador adquirido no final dos anos setenta, este servia para jogos simples,
xadrez nem pensar. Como este dispositivo era lento e desprovido de facilidades.
– Imagine, ainda não tínhamos aposentado a nossa máquina de escrever, e a gente
jogava xadrez no tabuleiro mesmo. O computador doméstico era um vídeo game
reprogramável, pelo menos era assim que era usado em nossa casa. Estudando
linguagem de máquina a gente criava nossos próprios jogos, com base nas
orientações de revistas especializadas, que eram conseguidas com amigos de
escola e nas bancas de revistas. Era tudo feito no teclado, e precisava de uma
paciência de Jó.
O computador foi evoluindo e se
tornando mais rápido a cada dia. E veio a internet, a rede internacional na
onde da globalização. Com a popularização da internet, o computador atual
passou a ser muito potente. E aliado aos celulares, propriamente aos smartphones, a velocidade e a capacidade
de transmissão dados se agigantaram. Houve uma explosão! Deixando o velho
postal, para os saudosistas. Então, o modelo postal foi sendo engolido pelos
e-mails e pelos sites especializados.
Com o transcorrer dos anos as
políticas dos correios foram se amoldando as novas facilidades de comunicação.
Visto que os custos foram aumentando, devido a menor demanda da carta simples.
E o tempo de trânsito de uma carta pelos correios foi aumentando tanto, que
tornou inviável o jogo postal. – Pelo menos para mim. Ainda existem alguns
heróis que jogam pelo modelo postal aqui no Brasil, onde o trânsito normal de
uma postagem simples é de uma semana, ou mais. Mas, o compromisso com o tempo
de duração de jogo foi grandemente impactado, pois o tempo de cada partida
passou para mais de dois anos. – Acho que a modalidade postal brasileira deste
jeito deve servir somente para jogos amistosos, bem amigáveis, só para manter a
comunicação com o amigo.
Xadrez postal e ética
Esta modalidade, assim como as
outras aplicações do jogo de xadrez, também passa pela discussão da ética, tão
presente, tanto na lei do xadrez como nos regulamentos dos clubes através da
manifestação do código de ética de cada entidade. Então o que é ética
enxadrística? – São princípios que cuidam do comportamento moral humano durante
a partida de xadrez e de todas as outras atividades associadas com sua
organização, promoção e desempenho. Então, um código de ética consiste de um
conjunto de princípios que servem como guia para a conduta humana. Para ser
eficiente, ele deve ser formulado, aceito e respeitado por todos. O uso de boas
maneiras durante uma partida. As boas maneiras consistem na observância das
regras estabelecidas para o jogo e a adesão às convenções sociais reconhecidas,
sem se permitir a liberdade de fazer exceções pessoais, o velho jeitinho, tão
presentes na conduta brasileira.
Benjamim Franklin foi o primeiro
americano a se manifestar sobre o assunto, conforme está expresso em sua obra Morals of Chess, publicada em 1779.
Nela, declara que “toda a circunstância que possa aumentar o prazer de sua
prática deve ser considerada; e qualquer ato ou palavra injustos, desrespeito,
ou que de algum modo passam causar mal-estar, devem ser evitados”. E ele segue citando
outros itens que ferem a boa conduta durante os jogos.
Na aplicação do xadrez postal está
aberta a consulta aos livros e seus estudos pessoais, entretanto a ética
sugeria que deveria ser evitada a consulta a terceiros, que poderia ser um
individuo, ou, um grupo de enxadristas. E atualmente, com a facilidade da rede
de computadores as preocupações ficaram mais agudas, porque a facilidade de
acesso aos programas de análise e processadores de jogos de xadrez é muito
grande. E nos sites de xadrez
especializados encontramos a preocupação com os programas chamados engine (*), programa motor, que podem
simular lances de grandes mestres (GM), um verdadeiro cérebro. Agora o jogador
tem os programas motores para treinar intensamente, entretanto existe o
problema se o jogador for mal intencionado, visto que o programa pode ser usado
em ambiente particular sem a participação de outras pessoas. – Agora complicou.
Entretanto, os sites especializados em xadrez, quando recebem uma reclamação,
procuram rastrear o jogo em questão. Se o resultado desta pesquisa for
positivo, o jogador é banido do site
imediatamente.
Logicamente, em conversa no clube
com outros enxadristas que jogam partidas ao vivo, quando abordamos o tema do
xadrez por correspondência, sempre aparece a questão da facilidade de hoje,
quanto ao acesso fácil aos programas de xadrez por parte dos contendores. Até
mesmo a consulta a outros jogadores ficou mais fácil, devido às diversas formas
de mensagens e imagens em busca de uma consulta ilícita. – Quando alguém
questiona como evitar este comportamento. Neste momento sempre respondo, que
precisamos acreditar num lance oculto do xadrez, a ética, pois de que adianta o
indivíduo jogar uma partida consultando um programa ou outro jogador?
Procedendo assim, quem está jogando é o grande mestre e não você. Que graça
tem? Jogar sem poder assinar o feito.
Bibliografia
Horton, Byrne J. – Moderno Dicionário
de Xadrez, IBRASA, São Paulo, 1973.
(*) engine -
qualquer programa motor, que analisa e simula lances dos grandes mestres.
Observação (1): a fota da figura 1 é uma composição entre a foto (Wikipedia) do Cientista, Inventor, Político, Diplomata, Enxadrista Benjamim Franklin e uma sala avulsa em xadrez obtida da internet.
Autor: Paulo Sérgio e Silva
\PSS
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