O Xadrez, o velho e o menino


Era sexta-feira, e os amigos da escola estavam conversando sobre ir ao clube, lá poderiam fazer muita coisa e ficavam contanto como era. Até que o menino do canto, o Joãozinho, disse que nunca tinha entrado num clube de verdade. Os meninos se admiraram e Carlinhos o convidou, para estar na porta do clube às dez da manhã do domingo, e não devia se preocupar com a volta, pois estará garantida. Lá tem muitas opções para brincar!

Foto1- Sala de xadrez onde jogo atualmente


O domingo chegou. E com alguns contratempos com a identificação e a demora em localizar o amigo, logo Joãozinho estava num clube bonito e grande, cheio de gente. E foi conhecer todos os amigos, ser apresentado aos pais do Carlinhos, familiares, e brincar com os colegas de clube. Foi correr pela quadra de futebol, conversaram por algum tempo, quando alguém propôs um jogo, mas quando formaram os times. Joãozinho sobrou. Depois de algum tempo resolveu ir ao salão, e foi andando entre as mesas, gostou mesmo da parte do salão que tinham armados os tabuleiros de xadrez. Um instrutor orientava quem quisesse aprender a jogar. Deu uma olhada e todos estavam ocupados com duas ou mais pessoas, exceto uma mesa lá no final. Foi direto para lá e notou que um senhor, já velho estava se aproximando. Chegaram juntos. O velho disse: - quer jogar? O menino respondeu afirmativamente, que sim. Mas, tinha uns amigos que ele deveria que ter atenção. E ele disse: – tudo bem!

O senhor pegou dois peões um de cada cor, cerrou nas mãos, e solicitou que o garoto escolhesse. E ficou feliz ao ver que o moço ficou com as pretas. Perguntou: – Tudo bem? E o menino. – Vamos jogar. Então, o vovô pegou o relógio e ajustou para uma cadência de dez minutos, para cada jogador, e posicionou o mesmo. E estendeu a mão dizendo: – eu sou Bené. Sou do interior do Ceará.

O menino respondeu: – E eu sou Joãozinho, e eu nasci aqui. Apertaram as mãos! O garoto pressionou o botão do relógio. E começou o jogo.

O senhor fez o velho o movimento 1.e4 ..., que foi respondido com 1.... e5.  Seguiu normalmente com 2.Cf3 ..., e o menino optou por uma linha de jogo agressiva, defendendo e atacando com 2. ... Cf6. O velho preferiu não entrar nesta “partida russa” e preferiu desenvolver o seu cavalo com 3.Cc3 ..., e o menino seguiu com outro desenvolvimento de cavalo defendendo o peão do rei 3. ... Cc6. Houve uma transição para a partida dos quatro cavalos, um sistema seguro onde os riscos estão no estudo posicional. E o vovô pensou um pouco e jogou: 4.d4 ....
Joãozinho olha para o tabuleiro! Vixi! Nunca vi, se eu jogar 4... exd4 5.Cxd4 Bb4 6.Nxc6 bxc6, gostei não! Depois parou um pouquinho, por sua vez o pequeno jogador pegou rapidamente sua peça e fez 4. ... Bb4, enquanto o livro recomenda a tomada do peão branco, exd4.

Neste momento da partida, ouviram-se os gritos dos amigos do pequeno jogador, então o garoto pediu licença e correu até o grupo de amigos. Não demorou muito. E voltou com um sanduiche e um refrigerante. O Senhor Bené não gostou do barulho que o garoto fazia ao mastigar o hotdog, e reclamou imediatamente. E pensou: – Esse pirralho está querendo complicar, não quero entrar no jogo dele. Fez o lance vagarosamente 5.d5 .... Enquanto poderia ter sido mais agudo capturando o peão central com o cavalo, Cxe5 ou cravando o cavalo inimigo Bg5.

Fig1- Depois de 5.d5 ...

Arre-égua! Ele agora vem com essa. Pensou rápido. Vou tirar meu cavalo e deixar o peão e4 dele para depois. E fez o movimento 5. ... Cb8. E ficou vendo o senhor falar que sobre perda de tempo, quando interrompeu. – O senhor mora perto daqui? O barulho não atrapalha?

O condutor das brancas respondeu. – As perguntas e esse mastigado melado é que me perturbam. E ficou pensando em defender o peão e4 com Bd3, mas preferiu jogar com a dama: 6.Dd3?! .... Duvidoso. E por sua vez o menino nem pensou e jogou 6. ... d6? Enquanto o esperado era que fizesse o roque O-O. Quando soltou a peça viu que a Dama branca Db5+ ganhava seu bispo em b4, trincou os dentes e ficou imóvel. Olhou para o salão e voltou a mastigar os últimos pedaços do sanduiche. E se sentindo incomodado o condutor das brancas jogou impulsivamente 7.Bd2  .... Quando de repente o jogador do time negro saltou de sua cadeira e fez: 7. ... Bxc3, verdadeiramente melhor seria fazer o roque O-O. E disfarçadamente o garoto deu uma volta pela mesa, e só então o senhor Bené viu que deixou passar um ganho certo de uma peça. Pensou alto: - Droga. Tudo bem, o passado não importa mais, foi! E agora o que fazer? O jeito é pegar esse bispo negro, e fez 8.Bxc3  ....

Ufa! Agora vamos proteger o rei, pensou o condutor das negras e o fez: 8. ... O-O. O senhor jogador das brancas preferiu preparar o roque menor e desenvolver uma peça jogando 9.Be2 ..... E agora o menino estava tranquilo seguiu desenvolvendo do cavalo, perdendo tempo ou não, mas tinha uma continuação 9 ... a5 10.O-O Na6 11.Cd2 Cc5 que foi desprezada. E moveu 9. ... Cbd7. Agora o velho jogador ficou pensando, que dúvida. Faço b4 limitando o espaço do cavalo dele ou Cd2 preparando o pequeno roque e protegendo o peão central. O velho olhou para o relógio e o garoto observou que tinha se esquecido de pressionar o botão, e então, num salto o pequeno acionou o mostrador das brancas corrigindo a falta. O senhor Bené disse que na Lei do Xadrez o movimento só é completado com o acionamento do relógio, então ele estava esperando a conclusão, e sorriu levemente! E jogou: 10.Cd2 ..... Opção mais segura.
O pequeno não gostou de estarem usando o tempo dele, mas vamos jogando e fez: 10. ... Cc5. Pensou, será que ele vai vê o meio ataque à rainha.

Fig2- Depois de 10. ... Cc5

O condutor das brancas mal deixou o garoto concluir o movimento, foi logo fazendo seu lance, pois já estava esperando: 11.Dd3 ...... E algum o chamou neste momento: - Pai!
E o senhor Bené atendeu sua filha, que veio avisar que ela e a família estavam indo. Então, ele respondeu. – Não tem problema estou de carro.

O menino estava pensando em obter espaço e não prestou atenção ao redor, preferiu jogar: 11. ... a5. Deixando para desenvolver o bispo da dama para depois. O condutor das brancas não quis correr risco e respondeu 12.a4 .... Ao invés de procurar agir no centro com f4, mas sem o roque ele preferiu esperar. E o pequeno jogador ainda fez o lance sobre o centro 12. ... c6. Adiando o desenvolvimento do bispo negro mais uma vez. E as brancas nem demoram e capturam o peão com 13.dxc6 ...., que logo é respondida com 13. ... bxc6.
O velho Bené pegou no peão do bispo tirou de sua casa, mas resolveu colocá-lo na mesma casa, desejando fazer o pequeno roque neste momento. Neste instante o garoto disse: - Epa! Agora é minha vez de dizer: na Lei do Xadrez a peça tocada deve ser jogada, não é mesmo? E o condutor das brancas humildemente fez 14.f3 ...., e não disse uma só palavra. Por sua vez o menino não quis jogar o cavalo Ce6 e resolveu jogar 14. ... Ch5? De olho na casa f4 no campo branco. Agora o time branco pode fazer o roque, mas não viu o lance Bxe5. E fez o roque 15.O-O?! ...., ainda encabulado. Contudo, neste momento melhor seria fazer g3.

O menino falou para o velho. – Não fica assim, porque regra é regra. Agora pensou o seguinte: vou abrir a coluna ‘f’ e vou levar o meu rei para o canto. E realizou o passivo movimento 15. ... Rh8.

Fig3- Depois de 15. ... Rh8

Neste momento o senhor Bené continua, também com outro lance defensivo. Ainda não viu Bxe5, que ganha material. E fez: 16.b3 .....Que foi respondido pelo jovem 16. ... Cf4. Entrando na ala do rei branco. Por sua vez o condutor das brancas ficou viajando pelo pensamento tentando elaborar como poderia melhorar a posição no tabuleiro, e jogou 17.Cc4 .... E o garoto estava imaginando um possível xeque-mate, e fez 17. ... Dg5, para susto do senhor Bené, que se atrapalhou todo com o fato, e respondeu muito rápido: 18.Tf2?? .... Para espanto do garoto. E não deixou o companheiro esperando a resposta, 18. ... Ch3+. Com este xeque o senhor Bené, coçou a cabeça, e moveu seu rei: 19.Rh1 .... O menino captura a dama branca: 19. ... Dxe3. E o velho captura a dama branca com o cavalo, e a torre fica solta: 20.Cxe3 .... E as brancas levam outro xeque e ficam sem a torre, 20. ... Cxf2+.

Fig4- Depois de 20. ... Cxf2+

Vagarosamente o condutor das brancas move seu rei, 21.Rg1 .... – O cavalo deste pirralho vai ser meu, pensou. E do outro lado. – Poxa! Não tem saída para meu cavalo, e o menino ficou imóvel com o queixo escorado pelas mãos, e fez: 21. ... Cfxe4. Por sua vez o velho capturou o cavalo: 22.fxe4 .... Não tem outra opção, capturar outro peão, que bom! 22. ... Cxe4. E agora o senhor Bené estava em dúvida, mover o bispo para a casa b2 ou e1. Se fizer 23.Be1 Be6 24.Bf3 f5, tudo que eu faço tá difícil, parou levantou a cabeça e escolheu a outra opção 23.Bb2 .... Nem pensou e retirou o cavalo negro sem defesa da central, 23. ... Cc5, quando se esperava um f5 defendendo o cavalo ou um Be6 desenvolvendo o bispo. Agora o senhor pegou a peça com força e posicionou firme, ouviu-se a batida da peça no tabuleiro, no lance 24.Td1 .... Mais uma vez o menino nem pensou olhou e jogou 25. ... Td8?  O velho riu e descontou 25.Bxe5 .... Eita! O que foi isso? O jovem retrucou, mas logo respondeu 25. ... Ba6 deixando duas peças brancas atacadas. – Menino que lance, disse o senhor Bené.

Fig5- Depois de 25. ... Ba6

Chegou o enxadrista orientador responsável pela área de jogo. – Algum problema? Estão precisando de alguma ajuda? – Não. Retrucou o senhor Bené. E ao mesmo tempo pegou no bispo em e5 e tirou a mão, quando levantou a vista encontrou o menino e o rapaz, orientador empregado do clube, assistindo o seu jogo. E vagarosamente vai levando a mão para o outro bispo na casa e2. Mas, neste momento o menino interrompe dizendo: – Olha a Lei do Xadrez. E o senhor Bené se irritou dizendo alguns: ora, ora, ora... E fez um movimento irritado, 26.Bxg7+ .... O garoto capturou fazendo 26. ... Rxg7, e foi dizendo: – melhor era jogar com o outro bispo e2 fazendo Bxa6 ou com esse bispo podia ter tomado o peão e5 com a torre. O velho respondeu, – E eu num sei! E o menino, perguntou: – e porque capturou dando xeque? O velho ficou pensando e não disse nada.

E o instrutor do clube interrompeu informando que as setas dos relógios tinham caído. – Como ninguém sabe qual a que caiu primeiro, pode ser considerada empate ou adicionar 2 minutos para ambos. O senhor Bené o olho para o moço e foi dizendo: – Jogo EMPATADO! O menino intercedeu, como? Estou ganhando. Quero os dois minutos. Mas, o velho afirmou. – Este jogo foi empate e vamos logo começar outro.

Fig6- Depois de 26. ... Rxb7

– Com licença, disse uma senhora acompanhada do Carlinhos. – Senhores o rapazinho aqui está comigo. Por favor, Joãozinho, vamos almoçar criança. Já estão servindo e depois vamos embora. O menino objetou: – só mais dois minutos. E o velho disse: – este jogo está empatado. Então, a senhora repetiu. – Realmente, está empatado! Vamos.

O menino retrucou. – Um momento! Todos olharam para ele. E o garoto estendeu a mão mais uma vez, para cumprimentar o amigo e disse: – EMPATADOS. O senhor sorriu e apertou a mão do jovem, que logo saiu. E o velho ficou observando eles seguirem apressados dentre as mesas.

Neste jogo encontramos o comportamento comum num jogo amistoso do dia a dia, o conflito de ideias e de gerações, tudo em volta e dentro do tabuleiro. Nem sempre o escore apontado para um jogo corresponde ao que está no tabuleiro (ganho = 1, empate = ½, derrota = 0). E o respeito aos limites internos e externos ao jogo é fundamental, também, é um lance que este magnífico jogo ensina. As crianças aprendem rápido, e estão afeitas ao nosso polimento, também o velho pode ser treinado gradativamente, contudo tem um dito popular que diz: “pau que nasce torto morre torno”. Será?

Autor: Paulo Sérgio e Silva
\PSS 



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