Xadrez – O professor da Siciliana

Atualmente, dentre as diversas defesas utilizadas pelos enxadristas condutores das pretas está a Defesa Siciliana. Tão popular. Falando em Siciliana vem à lembrança uma figura italiana, com quem joguei poucas vezes naquele tempo de Colégio. Foi a primeira vez que ouvi falar o nome desta famosa defesa. O velho padre era uma pessoa simples, sempre que necessário o velho e gentil instrutor preenchia os horários, quando algum professor faltava. A aula de religião sempre enveredava por uma conversa sobre bons costumes e ética, conversa esta que toda turma adorava visto que eram momentos de dialogo. Sem cobranças, sem repreensões, apenas orientações. Tinham várias perguntas, que misturavam coisas pessoais e religiosas, as quais eram respondidas com calma: – como se tornou padre? – Como veio parar o Brasil? – Como era a vida depois da morte? – E sobre os mandamentos da lei de Deus? E assim o tempo voava.

Figura 1 – Imagem do Colégio Piamarta acima dos tabuleiros
      
Era início do século XX e o rapaz italiano tinha sido designado pela família, para ir ao seminário. Mas, existiam algumas dúvidas, que foram superadas com a vontade de estudar. E na vida escolástica aprendeu a jogar xadrez, que se torno o passatempo preferido.
O seminário passou a ser uma opção séria. Contudo, o mundo era pequeno e vez por outra ficava sabendo das missões para o novo mundo. E para firmar o compromisso com a instituição religiosa. Em torno de 1920. Resolveu fazer parte de uma missão religiosa que vinha para o continente Americano, com os italianos católicos, que estavam migrando para a América do Sul. Nos primeiros meses ficou em São Paulo, mas logo foi informado que no Nordeste do Brasil o trabalho missionário estava precisando de voluntários. Pois, a seca castigava a região nordestina, onde espelhava a fome e esta afugentava seus humildes habitantes, rumo ao sul do Brasil. Assim, este foi enviado para o interior do Ceará, que seguiu com uma pequena mala e uma caixa onde guardava o seu amigável jogo de xadrez. Foi bem recebido pelos habitantes da pequena cidade de Baturité-CE e redondezas, que eram carentes, entretanto tinham grande coração e fé, que os moviam para vencer todas as adversidades. O trabalho nos primeiros meses foi grande, até o seu passatempo ficou esquecido, o xadrez. Não havia adversários disponíveis fora da vida do mosteiro. Os anos foram passando, missão após missão, e depois de peregrinar por várias pequenas cidades desta carente região, chegou à capital, Fortaleza-CE. Onde ficou prestando serviço no Colégio Católico, e com uma idade em torno dos setenta anos ainda tinha muito a ensinar, e sempre tinha um tempo para jogar uma partida de xadrez nas horas de folga.

No Colégio uma vez por semana durante o futebol, ministrado pelo professor de educação física. O velho levava o tabuleiro para jogar xadrez com quem estivesse fora do futebol. Durante os jogos conversava sobre coisas da vida.
Um dia alguns de seus familiares vieram visitá-lo, durante duas semanas. Nosso amigo pouco apareceu. Ficamos sabendo, que seus familiares trouxeram um presente para ele. Era um velho jogo de xadrez, "giogo di scacchi", da família, que ele a tinha tanto jogado em casa, antes de partida para as Américas. Segundo o experiente professor de religião este "giogo" não tinha mudado nada, ao contrário das pessoas. Agora no final da década de sessenta perto da aposentadoria, ainda apegado à terra que o acolheu. Mas, alguns meses depois nosso amigo seguiu para uma nova missão, ou mesmo, uma aposentadoria em algum mosteiro, ou voltou para a terra natal. Não sabemos ao certo o seu destino, contudo nestes quase dois anos os seus ensinamentos marcaram a nossa vida.


Não temos nenhuma partida do velho servo do Senhor, mas apresentamos na sequência uma partida minha, que mostra a defesa que o velho professor mais gostava de jogar, a Defesa Siciliana.


Diagrama 1 – Diagrama do jogo Xose1949 contra psshqib

Este jogo foi disputado na página do "chess.com". Joguei de Pretas e a partida acima terminou com o empate por acordo. Voltando à história acima um pequeno esclarecimento, pessoalmente, joguei muito pouco com o professor, além do curto tempo dividido com o futebol, também eu era iniciante e o experiente jogador me vencia em poucos movimentos. E a fila dos desafiantes andava. Tempos de bons ensinamentos.

Referência:

- O diagrama da partida ilustrativa foi gerado e comentado por mim no site “chess.com” ao qual sou filiado;

- A anotação das Peças= inglês/ português:  Torre=R/T; Cavalo=N/C; Bispo=B/B; Dama=Q/D; Rei=K/R; Peão=P/P;





Autor: Paulo Sérgio e Silva
\PSS


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