Visita de Carina à Natal

Neste mês de maio de 2022, acompanhei alguns torneios pela Internet e fiquei impressionado com o desempenho dos jogadores muito jovens, que já são mestres. Com certeza estes serão os grandes astros do xadrez mundial em alguns anos. São os atos da juventude mondando o futuro de novos adulto. Para ter estrondoso sucesso no xadrez tem que começar cedo, aprendendo os movimentos, as aberturas, os finais e estratégias, aliados a uma boa orientação no cultivo de bons hábitos. Do jeito que ocorre diante de um tabuleiro, também ocorre na luta diária da vida. A gente tem que seguir a vida se deixando amoldar por ela, ou então, vamos sendo adequados naturalmente pelo que a vida nos impõe ao decorrer dos anos. Neste segundo ato, a vida do participante vai ficando difícil, sendo tomada de desconfortos e insucessos. Nessa referência a juventude, fez-me lembrar de uma personagem, amiga, que há alguns anos recebemos em nosso apartamento.



Certo dia recebemos a notícia que Carina estaria nos visitando em breve. Vou registrar uma introdução sucinta de nossa visitante. Era uma mulher jovem bem moderna, e que os mais chegados a chamavam de Cari, ou Cacá. Vamos usar o primeiro apelido: Cari. Tinha pele clara e cabelos loiros longos; quando chegava fosse onde fosse fazia sucesso entre os marmanjos, principalmente, junto aos que frequentavam as festas e forrós de final de semana em Fortaleza. A garota não tinha uma estatura de miss Brasil, mas pouco importava diante da formosura dos seus dezoito anos, aliada ainda a firmeza nas palavras, isto a tornava o querer, entre os homens. E isso era garantido. O tempo passou rápido, e Cari estava vindo nos visitar, disseram que seria breve, e não daria trabalho algum. E fomos receber a jovem, numa parada de ônibus que fica no bairro de Neópolis. Numa das janelas do ônibus vi a Carina acenando, e quando o grande carro parou desceram vários passageiros. E a menina demorou um pouco, para receber a mala e vir ao nosso encontro. Entrou no carro e fomos conversando até o apartamento. Logo que chegamos no condomínio, disse que não ia ficar aquela noite em casa, pois tinha que conhecer uma boate da cidade indicado por um amigo, Chaplin, que ficava lá na praia do meio. Respondi que conhecia o local. A minha senhora não concordou com o fato dela, ter mal chegado, e já ia sair por aí. E continuou: – se a gente deixa você lá, quem vai pegar? Tem dinheiro para contratar um táxi? Cari rebateu: – é só de ida! E perguntamos: – E a volta, como vai ser? A confiante moça respondeu: – deixe isso por minha conta, que darei um jeito.

A mesa da sala estava posta, mas Cari não comeu muito.

Quando falou que estava na hora de ir a boate. Resolvemos deixá-la, mas sem antes esclarecer, que a volta seria por conta dela. Cruzamos boa parte da cidade, conversando sobre os amigos e últimos acontecimentos. Então, perguntei como ela pretendia voltar, visto que tinha pouco dinheiro. Ela em tom de brincadeira disse que não tinha problema, pois deveria conseguir um “otário” qualquer, que iria deixá-la em casa. E Cari ficou na porta da boate, já era perto da meia-noite. Antes dela sair do carro, eu disse que teria um bom café da manhã se me contasse as peripécias da noitada. E sorrimos.

No outro dia pela manhã bem cedo, no clarear da manhã ainda com o sol tímido, comecei a ouvir um som de música sertaneja. Era um carro novinho, que estava estacionado bem debaixo de minha janela. Logo, vi Carina descer do carro e dar meia volta e se debruçar na janela do carro, para se despedir aos beijos do recém conhecido “otário” (conforme ela tinha mencionado). Minha senhora não estava gostando nada disso, mas quem somos nós para nos intrometer na vida dos outros? Os pais dela é que devem se preocupar com tal comportamento. Fui rapidamente, preparar o desejum deste interessante amanhecer de sexta-feira, feriado nacional.

Fiquei pensando. Uma garota chegando a Natal pela primeira vez, para aproveitar o feriado prolongado e se mete a ir para uma boate no meio da noite. Essa menina é mesmo desprendida. Deixei a porta do apartamento aberta, apenas a grade estava travada, dessa forma poderia vê a visita chegar no hall de entrada. Devia está conversando com o novo amigo, sei lá o quê. Quando subiu, abri a grade e a visita deu um bom dia, e foi tomar um banho rápido. Depois veio para a mesa, que estava com o café da manhã, só esperando. Ela contou que para entrar na boate, ainda na calçada perguntou o nome do gerente. Com este nome foi ao porteiro e disse que queria falar com o gerente, pois tinham amigos comuns em Fortaleza. Rapidamente, o porteiro a indicou para outra pessoa, que a atendeu e se comunicou com o gerente, que a pediu para entrar. E assim, foi conversar com o gerente, e conversaram sobre citado amigo comum, dono de uma banda de forró. Conhecido pelo  anfitrião e amigos de longas datas. Enquanto isso, surgiram alguns outros amigos dele. E na roda de pessoas amigáveis, ela foi convidada para sentar à mesa deles. Quando perguntou pela entrada, alguém disse põe na nossa conta, depois a gente acerta. E durante a noite entre uma dança e outra, um dos convidados se engraçou dela. Resolveram sair dali e seguir para outro local, um restaurante requintado. Que ela adorou, pois já tinha dançado e se divertido e ainda tinha fisgado um peixe. Vocês já sabem quem. E continuou contando coisas mais ou menos assim. Nada como um local de música suave e belos coquetéis sem álcool. Depois de petiscarem um pouco saíram do restaurante e seguiram para um local mais romântico. Nesta parte não houve detalhes. E depois disso, finalmente, veio para o apartamento e ficaram conversando e namorando, ouvindo música. Tudo para não incomodar. Até notar alguma movimentação no nosso apartamento. 

E aproveitamos o café da manhã conversando. E eu pensando. Como uma menina dessa pode sair em Natal sem nenhum tostão e se divertir a noite toda? Enquanto, ela brincava com o poder de brincar com os homens. Retirou-se tranquilamente, foi descansar no quarto reservado às visitas. Fui fazer minha caminhada matinal, enquanto todos estavam dormindo, depois tínhamos que ir ao supermercado. Depois então, mostraríamos algum ponto turístico para nossa visitante. Mas, Cari recusou vê pontos turísticos, preferia ir a praia. Então fomos ao nosso clube da Associação dos Técnicos em Ponta Negra, tudo beleza, vários amigos e cerveja gelada. Um céu azul e um sol nordestino bem brilhante e quente. Mas, pouco tempo depois. A visita preferiu descer para a areia, contudo antes falamos que a gente iria a um outro restaurante para almoçar, mas a visita disse que já tinha nosso endereço e chegaria mais tarde. Então, foi descendo até desaparecer entre as barracas e se misturar ás pessoas na praia. E ficamos aproveitando a presença dos amigos por um tempo. Como Carina não voltou, fomos almoçar no restaurante de sempre, “O Peixe”. Gosto do nome deste restaurante na Avenida Roberto Freire, na época o restaurante ficava bem no alto da avenida. Tinha uma boa vista, que dava para vê a praia e parte da cidade. 

No fim da tarde. Chegou a nossa visita, alguém veio deixá-la, eram uns rapazes num carro. Ela contou que eram estudantes, e que um dele ira passar mais tarde para jantar. E perguntei se já conhecia esses meninos, ela disse que não. Conheceu o grupo numa das barracas. Eles foram bem receptivos, educados, segundo ela, e um deles tinha gostado dela. 

Continuamos nossos afazeres domésticos. Quase nove horas da noite, chegou um dos rapazes, que veio pegar a Cari para aproveitar a noite de sábado de Natal. E foram os dois, até pareciam amigos de longa data, ou namorados.

Estava no segundo sono, quando a campainha tocou, era nossa visita chegando do jantar. Olhei para o relógio, e pensei. Poxa! Quase uma hora da madrugada. E o rapaz a acompanhou até a porta do apartamento. Ela entrou e foi comentando baixinho, e sempre repetindo como os homens eram tão fáceis de ser manobrados. Mas, não eram de confiança, nenhum! Pensei, deve ser algum trauma, tão nova e já com estas ideias. Falou alguns detalhes da noite e como foi divertido. No outro dia, a Cari recebeu um telefonema da mãe, que reclamou do comportamento dela. Assim, que saiu do telefone, os rapazes bateram à porta, notei que na turma agora também havia outras meninas. Minha senhora lembrou que mais tarde ela tinha que ir para a rodoviária, conforme a passagem já comprada de volta. A menina respondeu que só seria às nove e meia da noite, tinha muito tempo. E saiu com eles. 

O dia passou, e pouco depois das oito horas ela chegou. Era uma pressa, foi tomar banho e se arrumar correndo, e fomos deixá-la na rodoviária. No caminho Cari nos contou parte do acontecido naquele dia. Como foi legal conhecer a turma, e que um dos rapazes estava apaixonado por ela, querendo namorar e ter um compromisso. Ela se divertia com a situação. Finalmente, a visita entrou no ônibus e nunca mais a família a deixou vir para Natal. Um dos rapazes ficou ligando perguntando por ela, demos o telefone dela, mas a danada sempre inventava histórias. E seis meses depois que ela se foi, ainda recebemos ligação do apaixonado. Então, resolvi abrir o jogo e contei mais ou menos esta história, que acabo de explanar.

Passados quase trinta anos, a Carina agora mora longe pelos “States”, ainda não casou. Acredito que aquela menina ainda não mudou a sua forma de pensar, mesmo com os tropeços da vida. Acho, que ela ainda pensa que os homens em geral são apenas peças de um jogo, para usar e descartar.

No xadrez periodicamente, o jogador deve fazer uma autocrítica e atualizar seu repertório de aberturas, mudar alguma coisa. Pois, com o passar dos anos, aquele ímpeto ao jogar na juventude vai mudando se perdendo pelo tempo, e consequentemente, o indivíduo deve também se amoldar e adotar novo estilo, para continuar vencendo na vida. Sabendo que no momento a linha de jogo não dá mais certo, o pensamento tem que mudar ao longo dos anos. Mas, se o jogador não faz isso vai ficando para trás. E no caso da pessoa da família da história, pelo visto o pensamento não mudou muito ao longo dos anos, por certo, assim vai continuar quebrando cabeça, neste mundo. Se existisse uma trilha para essa história, tem um sucesso que encaixaria bem. Uma bela música de Céline Dion, “All by myself”, numa parca tradução: “sozinha”.

Segue abaixo um problema de xadrez, para divertir. Descubra o lance chave das brancas, pois existe um e apenas um lance, que dá xeque-mate no Rei preto em dois lances.



As brancas jogam e vencem em 2 lances. Para melhor visualizar o jogo os peões brancos estão subindo, e os pretos estão descendo.

Observação

- A foto é uma composição que teve como base as imagens avulsas da Internet.


Referência

  1. O diagrama do problema foi retirado do programa LucasChess. A chave do puzzle é Qh2.


Autor: Paulo Sérgio e Silva

\PSS






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